Após o colapso da Divisão 4 em 1975 os protótipos praticamente desapareceram do automobilismo brasileiro, que passou a ser focado em carros de Turismo (Brasileiro de Marcas, Stock Car, Turismo 5000, etc) e Fórmulas (Vee, 2 e 3, etc). Essa situação perdurou até meados dos anos 90, quando duas iniciativas chave deram início ao renascimento dos protótipos no Brasil: em 1989 nascia o Aldee de Almir Donato, seguido pelos Proton 1.600 de Pedro Virgínio em 1990.
No Rio Grande do Sul, o piloto Paulo Barreto decidiu em 1993, também desenvolver seu protótipo para provas de longa duração como as 12 Horas de Tarumã e as 1.000 Milhas. Além da experiência nas pistas de quem iniciou sua carreira em 1972, o gaúcho também era professor da Universidade Federal de Santa Maria-RS, e chefe do laboratório de motores.
O projeto inicial, elaborado junto ao Engenheiro Paulo Romeu Machado, almejava obter financiamento do FINEP para a construção de um carro inteiramente novo, incluindo os ferramentais e equipamentos necessários à sua construção e operação, porém a lentidão burocrática do processo de aprovação levou a uma alteração de rota.
Partindo de um chassi Berta/Muffato da Fórmula 2 (presente do amigo e piloto José Carlos Rossi), Paulo Barreto iniciou o processo para adaptar uma carroceria parcial de Willys Interlagos. Com a assessoria técnica de outro amigo, o ex-piloto da F3 Sudam Ronaldo Ely, o carro foi montado no laboratório da UFSM com um motor VW AP 2.000 de cerca de 190 HP e uma caixa argentina Meriggi.
Também trabalharam no projeto alunos do curso de Engenharia Mecânica da UFSM e do habilidoso técnico José Adail Cunha “Bolinha”, que auxiliaram na construção da carenagem em fibra, tanque de combustível, santantonio e diversos acessórios, além de terem atuado como equipe de apoio de box durante as provas.
O carro ficou pronto no dia das 12 Horas de Tarumã de 1994, onde cravou a melhor volta da prova com o tempo de 1m17s009, porém quebras sucessivas da homocinética inviabilizaram que essa velocidade se transformasse em um resultado na classificação final.
Resolvido o problema, o carro obteve diversas vitórias nos Torneios de Verão entre 1995 e 1997, além do vice-campeonato gaúcho de endurance em 1996 e um terceiro lugar nas 12 Horas de Tarumã.
Em 1998 o regulamento da endurance foi modificado, e com isso o PB01 passou a carregar um lastro de 130 kg, o que comprometeu a rigidez estrutural do carro e performance dos freios, tornando o protótipo obsoleto frente aos Aldee Spyder que começavam a chegar ao Rio Grande do Sul. Ainda assim, o modelo continuou competindo até os anos 2.000 e atualmente encontra-se no Museu do Automobilismo Brasileiro, em Passo Fundo – RS. Quanto ao Paulo Barreto, ele construiu um segundo protótipo spyder seguindo a linha do Aldee Spyder e do MCR, história que traremos em breve aqui no site.
Análise aerodinâmica
O projeto aerodinâmico do PB01 buscou inspirações em diversas fontes, partindo de parte de uma carroceria de um Willys Interlagos.
Com essa base vestindo o chassi tubular, a dianteira foi modificada com inspiração no Yamaha OX99-11, uma associação que faz muito sentido: enquanto o protótipo japonês era uma espécie de “F1 para as ruas”, o protótipo gaúcho era baseado em um monoposto da Fórmula 2 sul-americana.
Na dianteira do PB01, podemos ver a asa integrada à carenagem ligando os dois pára-lamas (1), um dos principais pontos de inspiração tomados do Yamaha OX99-11. Além disso, existe uma série de tomadas de ar na região inferior para os freios (2) e para o radiador de óleo (3). Próximo ao pára-brisas existiam inicialmente duas tomadas de ar circulares (4), possivelmente para arrefecer o cockpit, porém essas tomadas foram fechadas durante a evolução do projeto (imagem abaixo).
Os radiadores, posicionados logo à frente das rodas traseiras, recebiam ar através de dutos de perfil NACA na carenagem lateral (5), e o motor “respirava” através de dutos NACA posicionados onde ficavam as vigias traseiras do Willys Interlagos (6). Na traseira, a inspiração vinha dos protótipos Jaguar do Grupo C como o XJR12, utilizando uma combinação entre um aerofólio integrado à carenagem (7) e outro de elemento único em posição superior (8).
Durante testes, ainda utilizando um motor CHT da Fórmula Ford, o PB01 chegou a ser testado sem a asa traseira superior, porém os resultados demonstraram que o elemento era estritamente necessário. Na imagem acima podemos ver também as saídas de ventilação das caixas de roda dianteiras, utilizadas para ajudar a ventilar o ar quente dos freios e também a pressão positiva acumulada dentro das caixas de roda, otimizando o downforce dianteiro.
Outro experimento realizado foram os orifícios na carenagem traseira, na tentativa de ventilar a pressão que se acumulava nessa região.
Leitura complementar:
Muffatão M1
A história do chassi Muffatão M1 começa em 1981, época em que a Fórmula 2 brasileira era composta basicamente por monopostos oriundos da antiga Super V. Buscando modernizar a categoria, o piloto-político-empresário Pedro Muffato adquiriu a licença para fabricar em Cascavel o chassi Berta Mk2 de Fórmula 2, enviando seus técnicos à Argentina para aprender as técnicas construtivas necessárias para a fabricá-lo no Brasil. Ao que me consta, o Berta por sua vez nasceu do projeto Berta Super V, desenvolvido sob encomenda para a equipe Hollywood em 1976, num evidente exemplo de como a vida dá suas voltas…
Seis meses e 8 milhões de Cruzeiros depois, o primeiro Muffatão chegou às pistas e se estabeleceu como modelo dominante da F2 brasileira. Com o fim da categoria em 1986, o chassi cascavelense ainda foi adaptado para a Fórmula 3 sem grande sucesso e para a Fórmula Ford, onde obteve vida nova.
Willys Interlagos
No início dos anos 60, o mercado automotivo brasileiro começava um movimento direcionado aos carros esporte, e a utilizar o automobilismo como ferramenta de marketing. A primeira montadora a estabelecer um departamento de competições foi a DKW, que logo foi seguida por outras, incluindo a Willys. Aproveitando da ligação com a francesa Renault que permitiu a chegada dos populares Gordini, foi estabelecida uma parceria com a Alpine para a produção local do modelo A108. Indicando a vocação para as pistas que se desejava para o novo carro, o departamento de marketing batizou o carro como Willys Interlagos, em alusão ao principal autódromo brasileiro.
Yamaha OX99-11
O Yamaha OX99-11 foi um protótipo desenvolvido pela Yamaha no início dos anos 90, utilizando o mesmo motor V12 fornecido pela montadora japonesa para equipes como Zakspeed, Brabham e Jordan, com o objetivo de ser um “F1 para as ruas”. Dessa forma, o carro foi construído com um monocoque em fibra de carbono, com o motorista posicionado ao centro e o passageiro em posição tandem, como em um caça. Uma série de problemas de desenvolvimento que atrasaram o projeto e o colapso da bolha imobiliária japonesa botaram fim ao projeto, com apenas três protótipos construídos.
Jaguar XJR12
Entre 1983 e 1991 a Jaguar desenvolveu uma série de protótipos XJR para competir no Grupo C da FIA e na GTP da IMSA. Inicialmente esses carros receberam o potente V12 7 litros da Jaguar, porém eventualmente surgiram modelos equipados com motores 3.5 V6 Turbo (que viria a equipar o XJ220) e Cosworth V8, para se adaptar ao regulamento de 1991 da FIA para o Grupo C. O último carro com o V12 aspirado foi o XJR12, vencedor das 24 Horas de Le Mans em 1990.
Agradecimentos
Deixo aqui meu agradecimento ao Paulo Torino que indicou o contato de seu chará, e principalmente ao Paulo Barreto pelas informações e imagens compartilhadas que tornaram possível essa publicação.
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TM1 (2003 – 2004)
O TM1 é um projeto raiz do início dos anos 2.000, construído sobre um chassi Muffato da Fórmula 2 e com carenagem “inspirada” pelo Toyota GT-One.
Roco 001 (2019 – )
Apresentado em 2019, o Roco foi desenvolvido por Robbi Perez e José Cordova com base em um chassi Ralt RT34 de Fórmula 3 e o powertrain da Suzuki Hayabusa para a categoria P3.
Fontes:
Aldee. Disponível em: https://www.lexicarbrasil.com.br/464/.
Proton. Disponível em: http://www.lexicarbrasil.com.br/proton/.
12 HORAS HISTÓRIA & ESTATÍSTICAS 1962 – 2021. Disponível em: https://corridaonline.wixsite.com/12horas/sobre.